Djavan lança álbum com música que era para Michael Jackson: ‘Resolvi fazer a letra e gravei’ https://www.terra.com.br/diversao/djavan-lanca-album-com-musica-que-era-para-michael-jackson-resolvi-fazer-a-letra-e-gravei,fa4dbbaed01df4a95a8c2802d2cb1379r779t2n4.html?utm_source=clipboard

Publicado em: 11/11/2025 às 11h15

No disco ‘Improviso’, cantor aborda o amor como tema central: ‘Não é uma composição confortável, porque eu não sou um expert em amor’, disse à Rolling Stone Brasil

Apesar de ser um dos sentimentos mais complexos e, talvez, mais difíceis de se descrever, o amor continua sendo um dos temas mais difundidos e populares da música brasileira. Mas, convenhamos, poucos artistas conseguem traduzi-lo como Djavan, que canta paixões, desencontros e desilusões há quase 50 anos de carreira.

A criatividade do artista alagoano segue plural e em plena forma. Com mais de 20 discos de estúdio, Djavan lançou nesta terça, 11, seu mais recente trabalho, Improviso, disponível nas plataformas digitais. O álbum reúne 12 faixas, das quais apenas uma não é inédita: a regravação de “O Vento”, conhecida na voz de Gal Costa.

Mais do que canções sobre amor, Improviso também reflete sobre o indivíduo, fala sobre guerras e presta homenagem a Michael Jackson em “Pra Sempre”. A melodia da faixa foi composta especialmente para o Rei do Pop em meados dos anos 1980, durante a criação do clássico Bad (1987), produzido por Quincy Jones. A parceria, porém, nunca se concretizou, e a música permaneceu guardada por décadas até que, por insistência dos filhos Max e Flávia, Djavan decidiu finalizá-la e incluí-la no novo disco.

Na última quarta, 5, o dia já anoitecia em São Paulo enquanto eu seguia de metrô (fugindo do trânsito caótico típico do horário na capital) até o escritório da Sony Music Entertainment Brasil, onde um simpático e receptivo Djavan recebeu a Rolling Stone Brasil para uma conversa.

Chegamos, fizemos o cadastro na recepção e subimos para o hall de entrada, onde aguardávamos o início do nosso bate-papo com o cantor, que falava com outros colegas. Em tom sereno, Djavan falou sobre Improviso, suas novas composições, as homenagens a Gal Costa e Michael Jackson e as transformações em seu processo criativo.

A história mais curiosa dos bastidores, claro, envolve o Rei do Pop. “Meus filhos sempre insistiram para eu gravar essa música todos esses anos. Eu nunca quis, achava que não fazia sentido: ‘Não rolou, vou gravar isso por quê?’ Era só a melodia; a ideia era o Michael fazer a letra, se gostasse”, relembra. “Agora, após tanta insistência, resolvi escrever a letra e gravei”.

“O Vento”, por sua vez, revisita a obra de uma artista que Djavan admira profundamente. Ao longo da carreira, Gal gravou 13 de suas composições — entre elas, “Açaí”, “Faltando Um Pedaço”, “Azul” e “De Flor em Flor”.

Aproveitei e trouxe de volta uma canção bonita, que a Gal gravou lindamente — como tudo que ela gravava. Foi basicamente uma homenagem à minha querida Gal Costa.

Quanto às músicas inéditas — em sua maioria composições recentes —, Djavan assina composições, produção e direção artística de Improviso. “É algo que já vem de algum tempo. Foi uma necessidade que foi surgindo”, explicou.

Segundo ele, arranjo é uma parte delicada em seu âmbito artístico: “Às vezes, você chama uma pessoa talentosa, que você gosta do que a pessoa faz, para um arranjo de uma música. O cara faz algo lindo, mas inadequado para a canção. Como dizer não para o sujeito? Algumas vezes eu gravei arranjos com os quais não estava totalmente satisfeito, só para não ter aquela saia justa.”

Comecei a ter dificuldade com pessoas que estavam produzindo meu disco e pensavam radicalmente diferente de mim. E também não foram produtores escolhidos por mim. Era uma briga porque eu não permitia que o sujeito colocasse uma ideia oposta à minha. Isso gerava um conflito enorme e um desgaste. Chegou um momento no qual pensei: ‘Não quero mais produtor, nem arranjador’. Aí passei a fazer tudo.

A tracklist de Improviso conta com 12 músicas, 11 delas inéditas — a maioria delas recentes. Como você compõe atualmente? Mudou muito de quando você tava começando há 50 anos?

Não, o processo continua igual. Já compus de várias maneiras. No início, eu fazia letra e música ao mesmo tempo. Depois passei a compor a melodia primeiro e escrever a letra depois. Também já fiz o caminho inverso — letra antes, música depois —, mas isso foi mais raro. De uns dez discos para cá, tenho feito a música e, em seguida, a letra. É um processo tranquilo, embora muita gente ache complicado e uma loucura — “como é que você consegue?” —, mas eu já estou nisso há muito tempo [risos].

Você acha que, entre tantos intérpretes que deram vida às suas letras, você acha que Gal Costa foi a que melhor conseguiu te traduzir?

Eu sempre tive sorte de ter bons intérpretes, que marcaram e trouxeram frescor ou novidade às minhas canções. Uma das coisas que mais me alegra nas interpretações dos outros é justamente o olhar distinto que cada um tem. Pode ter uma ou outra que não me encantou tanto, mas eu sempre gosto do fato de alguém regravar uma música minha.

Por falar no começo de sua carreira, A Voz, o Violão, a Música de Djavan faz 50 anos em 2026. Você tá preparando um lançamento ou homenagem específica para este seu icônico trabalho?

Estamos fazendo um lançamento que demanda cada vez mais trabalho, porque, com a internet, tudo se triplicou. A divulgação é extensíssima, são várias plataformas e veículos para acessar, e você precisa corresponder à demanda de todos. O trabalho é cada vez maior — e eu cada vez mais cansado [risos].

Mas compensa no final?

Compensa! E eu gosto também.

De volta a Improviso, o disco aborda o amor como tema central ali, algo que você já explorou muito bem ao longo de sua carreira. As letras falam sobre aquele amor mais inocente, aquele mais libertário, um amor mais profundo, um amor que dói. Enfim, como você consegue explorar o amor sem parecer monótono ou repetitivo, ainda mais que você virou símbolo de diversas relações amorosas?

Em primeiro lugar, é evidente que quem fala de amor em nuances tão distintas não está falando exatamente de si. Eu, geralmente, não costumo fazer canções autobiográficas. Na verdade, a grande graça da composição é a invenção: criar situações fora do seu universo, com as quais as pessoas se identifiquem ou não. Essa é a grande brincadeira. Eu gosto de fazer isso.

E as suas canções embalam a trilha sonora de inúmeros casais. Como é para você ver que o que você escreve conecta tantas pessoas e ganha um significado tão grande nas vidas delas?

Não é uma composição confortável, porque eu não sou um expert em amor. Sou um curioso e observo muito as pessoas. Existem situações inusitadas, tristes, felizes, de todo tipo. E é bom mexer com isso, porque é um risco. O amor é dinâmico, impossível de ser repetido. Portanto, escrever sobre amor não é se repetir jamais. É preciso coragem para se jogar nesse risco — que faz parte da minha vida. O risco é o que move, o que leva para frente e faz você evoluir.

Em “Um Brinde”, você fala que “ir atrás do amor é um Jazz”, que justamente está completamente ligado ao improviso. Como você chegou nessa conexão do amor e jazz? Por que eles se relacionam dessa forma?

Você fala “jézz”, eu falo “jázz”, cada um fala de um jeito [risos]. Quando eu digo “ir atrás do amor é um jazz”, é porque, entre nós, músicos, desde que comecei, sempre existiu esse ditado: “Isso aí é um jazz”, quando algo é difícil, bagunçado, sem uma absorção fluida. Então, é uma coisa complicada — por isso ir atrás do amor é um jazz.

Eu queria falar um pouco sobre a faixa “Sonhar”, que fala sobre “interceder sem interferir”. Sinto que ela tem um tom mais pessimista na letra, mas vem num direcionamento mais de conselho. Ele fala mais sobre relacionamentos e sociedade do que o amor romântico, né? Como você construiu essa faixa específica, que para mim é a mais diferente do disco.

“Sonhar” traz questões assim. Por exemplo, “interceder sem interferir” é uma busca. Para quem tem filhos, significa cuidar para que não tropecem e trilhem o melhor caminho. Em geral, a juventude, o adolescente, dificultam as coisas porque entendem diferente, são muito imediatistas.

Mas também falo de guerra, um assunto constante na nossa cabeça. O mundo está em guerra, e isso toca na falta de amor no mundo, nas relações entre pais e filhos, amigos, pessoas. É sonhar para que tudo dê certo, para que tudo se reorganize e a gente crie um mundo novo, onde o sonho seja leve, maravilhoso e positivo.

Conta mais sobre “Pra Sempre”, cuja melodia você criou após um pedido de Quincy Jones, quando Michael Jackson fazia Bad. Por que não rolou? Por que lançar agora, em 2025, após 38 anos?

Eu até levei, mas oito meses depois, quando eles já estavam mixando o disco. Demorei muito para mandar, não levei muita fé e não achei que fosse rolar. Depois, me encontrei com o Michael — o Quincy nos apresentou. Foi um momento bem bonito. Meus filhos, Flávia e Max, estavam comigo e sempre insistiram para eu gravar essa música todos esses anos. Eu nunca quis, achava que não fazia sentido: “Não rolou, vou gravar isso por quê?” Era só a melodia; a ideia era o Michael fazer a letra, se gostasse [da melodia]. Agora, após tanta insistência, resolvi escrever a letra e gravei.

E como foi esse encontro com o Michael? Sua relação com o Quincy era mais musical ou pessoal?

Quincy tinha uma editora chamada Rashida Music, e eu tinha uma chamada Capim, que era administrada por eles em Los Angeles. Ficamos amigos a partir daí. Encontrei com ele várias vezes lá [no exterior] e no Rio. Era uma pessoa acessível, maravilhosa, doce.

Michael tinha um faro e um olhar incríveis.

Na música “Improviso”, você também fala de dor, que também influencia diretamente sua vida e arte. Como é para você driblar a dor, de certa forma?

Olha, tem um ditado muito antigo que você deve conhecer: “Quem canta seus males espanta.” Cantar alivia muito, sabia? Quando você estiver com algum problema sério, comece a cantar que vai ver que a coisa melhora.

Improviso, na verdade, é um nome ambíguo. O improviso é uma reflexão que você faz da melodia dentro do limite que a base harmônica disponibiliza — ela dita o espaço aéreo que você pode dominar. Mais que aquilo, não.

Então, o improviso está contido. Embora seja expansivo, ele não obedece exatamente à melodia, mas está ali, dentro dela. Achei interessante dar esse nome a um disco que, por definição, não pode ser feito “no improviso”. Isso me pareceu bom.

Neste ano, você e outros ícones da MPB participaram dos atos contra anistia e a PEC da Bandidagem. Surgiu uma discussão de que os artistas da atual geração não se posicionam como você, Caetano, Gil, Chico, etc. Como você enxerga o lado político da nossa arte atualmente? Você acha que existe uma proteção maior à parte comercial em relação à artística?

Acho que isso sempre existiu. Há pessoas mais ligadas aos problemas nacionais, à política, às questões sociais e ambientais que, aliás, ganharam força nos últimos 20 anos, e outras que não estão. Penso que quem é mais culturalmente nutrido costuma se incomodar mais com o desnível social, com a falta de condições de uns e o excesso de condições de outros.

Nós sempre estivemos do lado que se preocupa com os governos, os administradores, o Congresso, o Supremo, que é quem acaba, no fim das contas, delimitando as coisas.

Neste ano, você e outros ícones da MPB participaram dos atos contra anistia e a PEC da Bandidagem. Surgiu uma discussão de que os artistas da atual geração não se posicionam como você, Caetano, Gil, Chico, etc. Como você enxerga o lado político da nossa arte atualmente? Você acha que existe uma proteção maior à parte comercial em relação à artística?

Acho que isso sempre existiu. Há pessoas mais ligadas aos problemas nacionais, à política, às questões sociais e ambientais que, aliás, ganharam força nos últimos 20 anos, e outras que não estão. Penso que quem é mais culturalmente nutrido costuma se incomodar mais com o desnível social, com a falta de condições de uns e o excesso de condições de outros.

Nós sempre estivemos do lado que se preocupa com os governos, os administradores, o Congresso, o Supremo, que é quem acaba, no fim das contas, delimitando as coisas.

 

 

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